sábado, 15 de novembro de 2008

Reflexos


Quando falámos na Piéta, e da dor de uma mãe com o filho morto nos braços, lembro-me de vos ter referido o poema de Fernando Pessoa. Tentem fazer a ligação entre as duas formas - a escultura e a poesia. A arte, como já vimos, reflecte o tempo que a cria, mas ela também molda o tempo e o nosso modo de ver.


O Menino De Sua Mãe

"No plaino abandonado

Que a morna brisa aquece,

De balas trespassado

– Duas, de lado a lado –,

Jaz morto, e arrefece.


Raia-lhe a farda o sangue.

De braços estendidos,

Alvo, louro, exangue,

Fita com olhar langue

E cego os céus perdidos.


Tão jovem! que jovem era!

(Agora que idade tem?)

Filho único, a mãe lhe dera

Um nome e o mantivera:

«O menino da sua mãe».


Caiu-lhe da algibeira

A cigarreira breve.

Dera-lhe a mãe. Está inteira

E boa a cigarreira,

Ele é que já não serve.


De outra algibeira, alada

Ponta a roçar o solo,

A brancura embainhada

De um lenço... Deu-lho a criada

Velha que o trouxe ao colo.


Lá longe, em casa, há a prece:

«Que volte cedo, e bem!»

(Malhas que o Império tece!)

Jaz morto, e apodrece,

O menino da sua mãe."


Fernando Pessoa


Podem ouvi-lo declamado por João Villaret http://www.youtube.com/watch?v=9o89o4LxxAM

2 comentários:

Ana disse...

Ai! tenho saudades :S

Anônimo disse...

Os dois se referem a dor de uma mãe ao perder o filho mas de certa forma a pietá parece ter um cariz muito mais religioso em comparação com a poesia ainda assim e peço desculpa se me repito, os 2 abrangem de forma "poética" o sofrimento da mãe.

Ricardo 11ºj